A vida das aves na floresta estava ficando muito difícil por causa dos desmandos, das leis arbitrárias e dos impostos criados pelos tucanos e pelas cacatuas, os pássaros não podiam mais cantar, voar livremente, beber no rio. Debaixo dos pequizeiros, das castanheiras, dos jatobás e de muitas árvores frutíferas, onde era costume os animais se reunirem na boca da noite para um jantar mais farto, já não se podia mais frequentar, pois os papagaios gritavam e denunciavam os infelizes que ali degustavam as frutinhas.
Em meio a tantas injustiças uma arara destemida decidiu abrir o bico e denunciar as arbitrariedades que açoitavam os pássaros daquela floresta, começou em uma arvore modesta, tendo algumas rolinhas, sabiás, xexéus e periquitos como ouvintes. A arara falava dos direitos atribuídos aos pássaros, direitos estes dados por Deus, pela natureza, proclamava que as arvores não tinham donos, que as frutas eram de todos, que as asas eram presentes, bênçãos que somente eles tinham na terra e não usá-las era como tira-lhes a alma, seria uma gaiola sem grades, as declarações da arara chamavam a atenção de um número cada vez maior de pássaros.
A pequena árvore já não era mais suficiente para as palestras da arara, a multidão de aves que se juntava, exigia árvores mais altas e galhos mais robustos e em pouco tempo toda floresta se reunia ao meio dia para ouvir a arara destemida.
A fama da arara logo chegou aos ouvidos dos tucanos, era preciso tomar uma providência, afinal, os tucanos e as cacatuas já tinham uma enorme dificuldade em lidar com um galo vermelho, que governava uma pequena parte da floresta, o local era verde repleto de frutas, próximo a duas lagoas, com uma orla plana, compondo um local de rara beleza, repleto de palmeiras onde cantavam os sabiás, de onde os tucanos e as cacatuas após governarem por décadas e espalhado a fome e a miséria, haviam sido expulsos e proibidos de frequentar, mas, nunca se conformaram e tentavam de todas as formas retomar a área.
Um dos tucanos então teve uma ideia, reuniu-se com as cacatuas e compartilhou com os aliados seu plano: “Vamos convidar a arara a fazer parte da nossa cúpula, daremos a ela o comando de algumas árvores próximas as duas lagoas e ela será nossa representante naquela localidade”…. “Hummm excelente ideia e este ainda poderá em suas palestras deferir ataques ao Galo Vermelho, assim pegaremos dois pássaros com uma só arapuca”, disse a cacatua mestre.
E assim fizeram os tucanos e cacatuas, o convite foi realizado e para surpresa de muitos, foi aceito pela arara, suas palestras continuaram e a arara agora de terno e gravata, já não mais deflagrava ataques a elite da floresta, já não mais apontava os erros dos tucanos e das cacatuas, seu alvo agora era apenas o galo vermelho, suas palestras já não mais apontava os cortes nas asas dos pássaros, a exploração do João de Barro, a aglomeração dos ninhos, oriundas dos desmandos dos tucanos e das cacatuas, as frases já se tornara repetitivas e os pássaros diziam, que a arara virou tucano, virou papagaio.